Ir direto para menu de acessibilidade.

Nós usamos cookies para melhorar sua experiência de navegação no portal. Ao utilizar o ufabc.edu.br, você concorda com a política de monitoramento de cookies.

Para ter mais informações como isso é feito, acesse a Norma de uso de cookies nos Portais da UFABC.

ACEITAR
Página inicial > Artigos > O mercado nuclear brasileiro
Início do conteúdo da página

O mercado nuclear brasileiro

Publicado: Segunda, 02 de Junho de 2008, 11h48

Artigo dos professores Pedro Carajilescov e João Manoel Moreira Losada,da UFABC, e do professor Eloi Fernandez y Fernandez, da PUC-Rio, sobreo potencial de exploração das reservas brasileiras de urânio. Apublicação ocorreu no jornal "Valor Econômico" (3/12/2007).

A questão energética é crítica para o desenvolvimento de qualquer paíse nenhum país pode se descuidar dela. No caso do Brasil, apossibilidade de escassez e suas implicações na taxa de crescimentoeconômico vêm sendo motivo de preocupações de acadêmicos, empresários ede alguns setores do governo.

Do ponto de vista da segurança energética, petróleo, gás natural eminério de urânio possuem importâncias estratégicas similares.Observamos, no entanto, que o setor de petróleo e gás já se encontrabastante amadurecido, e as anunciadas reservas do campo de Tupi podemrepresentar algum alívio para as necessidades de médio prazo. Por outrolado, o desenvolvimento de tecnologia de reatores nucleares demanda umtempo bem mais longo que o início de produção de um poço de petróleo egás em águas profundas, após a sua descoberta, além de requerer elevadomontante de recursos financeiros.

Com as preocupaçõescrescentes com as mudanças climáticas, os países desenvolvidos voltaramseus olhos para a energia nuclear, como uma opção limpa por nãoenvolver a emissão de gases de aquecimento global, provocando umressurgimento mundial da geração nucleoelétrica, observado nos últimosanos. Como conseqüência disto, os preços do minério de urânio,concentrado e purificado (yellow cake), e de alguns serviços do ciclode combustível sofreram variações expressivas. No mercadointernacional, em cinco anos, a libra-massa de yellow cake saltou deUS$ 9.50 para US$ 95.00, a conversão de um quilo de óxido de urâniopara hexafluoreto de urânio, necessário para o processo deenriquecimento, foi de US$ 5.50 para US$ 12.50, o custo doenriquecimento subiu de US$ 90.00 para US$135.00 por unidade detrabalho separativo, assim como o custo de fabricação dos elementoscombustíveis, de US$ 275.00 para algo em torno de US$ 500.00 por Kg deurânio (Fonte: UxC Nuclear Fuel Prices Indicators).

Considerando-se as condições do Brasil, que possui reservasconsideráveis de minério de urânio e pleno domínio tecnológico do ciclodo combustível, poderíamos encarar a situação atual como umaoportunidade de negócios e ser um participante ativo deste mercadomundial, gerando recursos para o nosso desenvolvimento pleno egarantindo a estabilidade do fornecimento elétrico do país.

Vamos fazer um exercício simples sobre o que poderíamos obter apenascom nossas próprias reservas de urânio e domínio tecnológico. Segundo aINB Indústrias Nucleares do Brasil -, o país dispõe de 309.000toneladas de minério de urânio. O custo de exploração, concentração ebeneficiamento deste minério encontra-se estimado em 22 bilhões dedólares e o valor de mercado do produto final, hoje, é da ordem de 64bilhões de dólares, resultando em uma diferença líquida de 42 bilhõesde dólares. A conversão das reservas em hexafluoreto de urânioresultaria em adicionais 3.3 bilhões de dólares, o enriquecimento dourânio a 4%, típico de reatores a água leve pressurizada (PWR), outros32.1 bilhões, e a fabricação de elementos combustíveis, mais 17.3bilhões de dólares.

Em números aproximados, nossas reservas atuais poderiam proporcionar uma receita bruta de 94 bilhões de dólares.

Obviamente, a comercialização total das reservas não seria recomendávele poderia comprometer nossas necessidades de geração elétrica.Entretanto, se considerarmos reatores nucleares típicos, dos quaispodemos retirar 40 GW-dia por tonelada de combustível, nossas reservaspoderiam gerar em torno de 11 bilhões de GWh(e), o que corresponde,aproximadamente, à geração contínua de 27.000 MW durante 50 anos. Sãonúmeros expressivos se observarmos que, juntas, as usinas nuclearesAngra 1, 2 e 3 irão gerar apenas 3.300 MW.

Conclui-se que acomercialização de parte de nossas reservas poderia gerar receitas paraviabilizar o desenvolvimento do setor nuclear brasileiro semcomprometer as reservas estratégicas de urânio. Diante do esforço járealizado pelo país, com o acordo nuclear Brasil-Alemanha e com oprograma autônomo do Ministério da Marinha, em pouco tempo, o Brasilpoderia se transformar em exportador de tecnologia de centraisnucleares e de serviços do ciclo do combustível, com enormes vantagenspara o parque industrial brasileiro.

Ainda, não podemosesquecer que estas reservas se encontram estagnadas a mais de 10 anos,tendo em vista a inexistência de um mercado interno demandante. Com oapelo da comercialização controlada, a retomada da prospecção dominério de urânio poderá ampliá-las consideravelmente, da mesma formacomo vem ocorrendo com as reservas de petróleo e gás.

Entretanto, o Art. 177 da Constituição Federal, em seu inciso V,constitui a pesquisa, a lavra, o enriquecimento, o reprocessamento, aindustrialização e o comércio de minérios e minerais nucleares e seusderivados em monopólios da União, impedindo a entrada de novos atoresnestes segmentos. Convém lembrar, no entanto, que este mesmo artigo daConstituição teve seus incisos I a IV, referentes a petróleo e gás,alterados pela Emenda Constitucional Nº 9, de 09/11/1995, resultando emgrande dinamização e avanço tecnológico nestes setores.

Decisões sobre nosso desenvolvimento nuclear são urgentes sob pena deperdermos as oportunidades geradas pelo mercado nuclear aquecido,correndo, ainda, o risco de deteriorarmos ou tornarmos obsoleta nossacapacidade tecnológica, arduamente adquirida, do ciclo do combustível eem alguns segmentos da tecnologia de reatores nucleares.

Diante do exposto, é evidente que o setor pode gerar os recursosnecessários para seu próprio financiamento, dependendo apenas de umposicionamento político do governo e o estabelecimento de um novo marcoregulatório para este segmento estratégico.

Pedro Carajilescov (UFABC)
João Manoel Losada Moreira (UFABC)
Eloi Fernandez y Fernandez (PUC-Rio)

Registrado em: Artigos
Fim do conteúdo da página