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Universidade de Classe Mundial: a UFABC lá?

Publicado: Sexta, 31 de Janeiro de 2014, 13h54

Helio Waldman

Nos últimos dias 23 e 24 de janeiro, a Fapesp promoveu um evento sobre Excelência no Ensino Superior, com a participação de autoridades da CAPES, da Academia Brasileira de Ciências e da própria Fapesp, além de um seleto grupo de estudiosos do tema, que discutiram o cenário brasileiro e mundial, inclusive no que diz respeito à questão das Universidades de Classe Mundial ou "World Class Universities" (WCU's), tão apreciadas por todos os países, mas praticamente ausentes no Brasil.

Na ocasião, foi defendida a tese da diferenciação do nosso sistema de ensino, de maneira que algumas Universidades brasileiras sejam estimuladas a se tornarem WCU's mediante um aporte maior de financiamento e a concessão de mais autonomia para a atração de talentos e a agilização de procedimentos voltados para o avanço da pesquisa científica.

Motivados por esta Tese, que nos parece merecedora de consideração, pretendemos discutir aqui a chance da UFABC e de outras Universidades brasileiras se tornarem uma Universidade de Classe Mundial (WCU). A questão é complexa, pois ninguém sabe muito bem o que é uma WCU. Assim sendo, teremos que nos orientar por um referencial próprio, mas plausível, entendendo que uma Universidade é de classe mundial quando a sua produção científica for reconhecida mundialmente como significativa e de alto impacto. Assim, faremos a avaliação proposta com base nos indicadores de volume da produção da UFABC e de algumas Universidades que mais se destacaram no século XX, bem como do seu impacto na literatura científica. Esses indicadores são disponibilizados pelo ranking Scimago a partir da base de dados Scopus. São eles: o indicador "Output", que denota o número de artigos publicados numa janela de cinco anos que termina no penúltimo ano antes do ano de referência (por exemplo, na janela 2007-2011 para o indicador de 2013); e o indicador NI ("Normalized Impact"), que representa a média do número de citações desses artigos, normalizada em relação à média mundial na área de cada artigo.

A Tabela 1 mostra a evolução desses indicadores para a UFABC desde 2010 (janela 2004-2008), até 2013 (janela 2007-2011). É relevante observar que a UFABC começou suas aulas em setembro de 2006 com apenas uma centena de docentes, de maneira que o forte crescimento do volume da produção retratado na Tabela se deve, entre outros fatores, ao crescimento do período observado, que se esgota em 2013. De um modo geral, porém, os percentuais de crescimento se situam entre 20 e 30% acima do que seria causado apenas pelo aumento do período medido, refletindo o aumento do número de docentes (atualmente 510), da sua produtividade, e da pós-graduação.

Quanto ao indicador NI, observamos que ele se situou entre 1,46 e 1,71 no período, sendo hoje igual a 1,67, com tendência ascendente. Isto significa que os artigos publicados pelos docentes da UFABC entre 2007 e 2011 foram citados, em média, 67% acima da média mundial de suas respectivas áreas, o que representa um reconhecimento mundial da sua qualidade e relevância. Cabe também observar que a UFABC é a única Universidade brasileira cuja produção científica é citada acima da média mundial.

UFABC no ranking Scimago
Ano NI "Output" Crescimento (%)
2010 1,71 284 -
2011 1,46 583 105
2012 1,59 951 63
2013 1,67 1423 50

Tabela 1 - Evolução dos indicadores da UFABC de 2010 a 2013

Para sabermos se a UFABC é de classe mundial, porém, precisamos verificar como ela se situa em relação às demais Universidades do mundo nestes quesitos, e especialmente em relação ao grupo das cem ou duzentas que lideram o mundo em cada um deles. Para isso, recorreremos novamente ao ranking Scimago. A Tabela 2 mostra as "notas de corte" dos grupos das cem e das duzentas melhores Universidades do mundo em cada indicador, bem como as suas detentoras. No índice NI, a situação da UFABC é muito confortável, pois já estamos entre as 200 melhores, uma vez que, com NI=1,67, já superamos a Universidade de Oregon, 200ª colocada neste quesito com NI=1,63. Ainda não chegamos ao grupo das cem melhores, mas para isso basta prosseguir no crescimento do nosso NI, já observado na Tabela 1, até ultrapassar a U. Dundee, que tem NI=1,78 e está em 100º lugar no mundo.

2013 / Benchmarks / Scimago
Benchmark NI "Output" Output "gap" (x)
100º 1,78 (U. Dundee) 20703 (Vanderbilt U.) 14,5
200º 1,63 (U. Oregon) 13292 (U. Gottingen) 9,4

Tabela 2 Onde estão o 100o e o 200º lugares em cada indicador.

No quesito "output", porém, temos que reconhecer que a UFABC está abaixo dos "benchmarks" por cerca de uma ordem de magnitude. Porém, é auspicioso observar que a nossa produção vem crescendo cerca de 30% ao ano sem queda no seu impacto, que já vem crescendo desde 2012. Com o apoio necessário, creio ser possível aumentar o corpo docente em 10% ao ano e a pós-graduação em 20%, gerando um crescimento de 30% ao ano da produção sem perda da qualidade, que já é compatível com a classe mundial. Mais recursos são necessários para aumentar e melhorar a infra-estrutura e o apoio técnico-administrativo, bem como atrair mais talentos mediante a concessão de mais bolsas e auxílios e da residência universitária, inclusive e especialmente para a pós-graduação. Aplicando-se um crescimento de 30% ao ano à nossa produção atual de 1423 artigos, empataremos com o 200º lugar atual em 8,5 anos e com o 100º em 10,2 anos. Ou seja, é possível fazer da UFABC uma Universidade de Classe Mundial em cerca de uma década. Seria imprudente tentar fazer isso em menos tempo, pois poderíamos tropeçar na qualidade.

Por outro lado, existem quatro Universidades brasileiras em posição muito confortável no quesito "output", por superarem pelo menos um dos benchmarks citados. São elas, tendo entre parênteses o respectivo o número de artigos publicados entre 2007 e 2011: a UFRJ (14900), a UNESP (16998), a Unicamp (17130), e a USP (48156), sendo esta última detentora da quinta maior produção do mundo! Outras três poderiam chegar lá mediante acréscimos de até 50% em sua produção: a UNIFESP (9461), a UFMG (10810), e a UFRGS (12386). O problema é que todas essas sete Universidades estão com o seu fator de impacto estacionado em torno de 0,8 (20% abaixo da média mundial), com ligeira tendência de queda. E a maioria das demais está abaixo disso, com algumas exceções, que apenas igualam ou excedem ligeiramente as sete grandes: o segundo maior NI do Brasil é 0,95, da Univ. Estadual da Paraíba (474).

Para ultrapassar o benchmark do 200º lugar, que corresponde ao NI=1,63 exibido pela U. Oregon, qualquer uma das sete grandes teria que dobrar o seu fator de impacto! Isso não é impossível, mas exige uma mudança da cultura organizacional que, se bem conduzida, levaria talvez uma geração. Isso não quer dizer que não exista excelência nessas Universidades. Pelo contrário, existe muita, mas ela está concentrada em alguns grupos, principalmente os chamados programas de nível 6 e 7 da Capes, que são nacionalmente reconhecidos como de classe mundial!... Verdadeiras ilhas de excelência, esses grupos tendem a apresentar um recorte fortemente disciplinar, deixando a Universidade mal preparada para o novo modo de produção do conhecimento caracterizado pela interdisciplinaridade. Numa Universidade do século XXI, é inconcebível que a excelência esteja concentrada em alguns espaços segregados. Corrigir isso é possível, mas requer muita conversa e negociação, tanto com atores internos como externos à Universidade.

Se o Brasil deve ou não deve investir para ter uma ou mais Universidades de Classe Mundial, como querem os demais BRIC's e quase todo o mundo, é uma questão de política pública que está além do horizonte deste artigo. Querendo ou não, porém, nossa avaliação é que não teremos uma Universidade de Classe Mundial durante a década em curso: simplesmente não dá para colher agora o que deveríamos ter semeado no século XX. É possível, porém, continuar apoiando a UFABC para que ela cresça sem perda de qualidade, chegando à classe mundial já na próxima década. E é possível também promover mudanças culturais e institucionais em nossas grandes Universidades do século XX para que elas cheguem a esse status, mas isso exige mudanças estruturais que sequer começaram a ser discutidas com os atores envolvidos.

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